1 de abr. de 2010

1º de abril

Sinto saudades da minha mãe todos os dias. Hoje não é mais aquela saudade dolorida, porque o tempo tem esse poder meio mágico de decantar as coisas -- a dor vai descendo e encontra um canto pra morar no fundo do coração da gente. É só não remexer muito que a dor fica lá, quietinha, não se mistura com as lembranças gostosas. Essas, pelo contrário, ficam cada vez mais cristalinas. A saudade que sinto dela é assim: como se fosse uma presença transparente que está sempre por perto. Faz parte, vive comigo e isso é bom de sentir.
Mas também tem o tempo do calendário marcando os dias em que a falta fica mais presente ainda. Os aniversários, as datas disso e daquilo, e o dia 1º de abril. Acho que ela já começava a pensar na peça que ia pregar na gente uns dias antes. Ela ligava cedinho com a novidade. Era sempre uma bobagem, um boato, uma mentirinha qualquer. Toda vez eu caía na conversinha dela e depois ficava me sentindo a mais boboca das bobocas quando ela vinha com a história do 1º de abril. Ela pegava todo mundo -- minha irmã, os netos, nesse dia era mais criança do que eles.
No dia da mentira parece que a minha saudade fica ainda mais de verdade.

(ST)

6 comentários:

Denise Portes disse...

Silvana
Você consegue ser delicada até pra falar da dor mais doída.
Lindo texto!
Um beijo
Denise

Thais Abrahão disse...

Lindo texto, lindas recordações...

Natali Assunção disse...

Essa sua capacidade de lidar com as palavras de maneira tão simples e verdadeira me emociona, sabia?
Obrigada por mais um texto tão meigo.
Também sinto saudade. De muitas coisas, pessoas e lugares.

Regina Guedes disse...

Silvana,
não sei como você consegue falar de dor (esta em especial) com tanta ternura e delicadeza. Lindo como tudo o que você escreve! Mas... se me permite... este é muito especial pela dor de uma perda tão importante.
Beijinhos,
Regina

Sergio disse...

Siempre me es gratificante recorrer el mundo de los blogs… y encontrar algunos como el tuyo. También tengo la esperanza que alguna vez pueda verte por el mío, que también se escribe en portugués, sería como compartir esta pasión por escribir que une a tantas personas y en tantos lugares...

Sergio

Márcio Almeida Júnior disse...

Compreendo esse tipo de saudade, Silvana. E me admiro com a forma como você consegue transpô-la para o papel.