12 de mai. de 2018

escrever

Às vezes começo colocando um sofá no meio da sala. De vez em quando, os primeiros móveis vão direto para o quarto, e é lá que fico morando um tempão, meio fechada, sem pensar na mobília do resto da casa. Cada vez acontece de um jeito, mas escrever pode ser exatamente assim, e as histórias só terminam quando a casa está toda equipada, com roupas dentro do armário, cheiro de bolo na cozinha, portarretratos e objetos espalhando lembranças por todos os cantos.
Enquanto moro nesse lugar, muitas vezes mudo a decoração, hospedo pessoas que vão e vem, aprendo a conviver com quem acaba ficando. No final, quase sempre é difícil abandonar essa morada – depois de um tempo a gente se apega, tudo em volta já se tornou querido e familiar demais. Com certa tristeza, me preparo pra ir embora, mas enquanto checo todas as coisas pela última vez também fico satisfeita vendo que a casa está montada, em ordem e pronta pra receber visitantes. Então passo um tempo perambulando pela cidade, me atrevo por bairros desconhecidos, descubro ruas simpáticas e, em algum momento, me interesso por outro endereço. Nos primeiros dias estranho tudo: os barulhos da vizinhança, a cara do jornaleiro, a distância até a padaria. Mesmo assim, decido ficar porque, depois de pintar as paredes de branco e passear sem pressa pelos espaços ainda vazios, sinto o perfume de uma história novinha em folha misturado ao cheiro da tinta fresca.