29 de jan. de 2012

Foi assim: em agosto do ano passado, conheci o ilustrador e designer Daniel Kondo, meu parceiro nos eventos da Jornada Literária de Passo Fundo. A dobradinha deu certo: quando um engasgava, o outro falava, e assim dois tímidos conseguiram não fazer feio durante as apresentações. Acabamos virando "amigos de infância" e, na volta, partilhando outro medo, o do avião, ele propôs fazermos um livro juntos. Eu não tinha nada inédito na gaveta, mas andava com uma certa ideia na cabeça. Como ele se animou com o tema, resolvi escrever logo que cheguei e mandei o texto, imaginando que ele levaria algum tempo pensando em como ilustrar aquela história. Pra minha surpresa, dois dias depois, o texto já estava numa dupla, me mostrando um novo caminho: aquele era o projeto perfeito para um diálogo e não um monólogo, como o da minha ideia original. Reescrevi o texto e, a partir daí, fomos trabalhando juntos -- as palavras mudando a partir das ilustrações e vice-versa. Foi uma experiência deliciosa e, em menos de um mês, tínhamos um livro pronto. Por uma dessas coincidências que parecem mágica, acabava de ser anunciado o Concurso de Literatura João de Barro que, diferente das edições anteriores, iria premiar textos infantis não apenas inéditos, mas já ilustrados e devidamente editados num projeto gráfico. Graças à minha comadre, a escritora May Shuravel, ficamos sabendo do concurso e resolvemos tentar. Tudo pronto, faltava apenas escolher os nossos pseudônimos: tinha que ser uma dupla especial, como tudo nessa história. Na sexta-feira, quando recebi a notícia do prêmio, tive certeza de que Julia K, filha de Daniel, e Caio T., meu filho, deram a maior sorte para o nosso "Pssssssiu".

24 de jan. de 2012

Intervalo

Quando eu era pequena, as férias na praia duravam quase três meses e os dias de chuva não atrapalhavam. Era até gostoso ter motivo pra ficar em casa, inventando brincadeiras sem areia. Hoje o tempo encolheu, e as férias também: por isso, estou torcendo para que a chuva dê uma trégua e nos próximos dias eu consiga ouvir só o barulho do mar.

A ilustração é da Maria Eugenia.
Até segunda!

18 de jan. de 2012

Magas

Elas já apareceram aqui, há dois anos, no dia em que ganhei esse presente de uma amiga querida. Vieram dentro de uma caixinha, enroladas num manual de instruções que ensina a brincar com as bonecas de acordo com uma antiga tradição do Vietnã. Acontece que a brincadeira é séria: a ideia é conversar com uma das três sempre que a gente estiver precisando resolver um problema, e eles recomendam que essa conversa aconteça de noite, um pouco antes da hora de dormir. Daí a confidente sai da caixinha, escuta tudo com atenção e, durante a noite, enquanto a gente descansa, ela vai tentar resolver a questão. As regras são rígidas: como são só três bonecas, é permitido ter no máximo três problemas por dia.
Desde que chegaram, elas dormem na gaveta do meu criado-mudo. Muitas vezes abri a caixinha só pra dar um olá, e por longos períodos esqueci que as três estavam ali, prontas pra ouvir e ajudar. Mas, ontem, bati um longo papo com as três -- como a história é um pouco complicada, achei melhor abrir uma exceção e convocar uma junta. Enquanto elas continuam buscando uma solução, eu arranjei um tempo pra pensar em outras coisas, inclusive no blog, que ficou meio abandonado nos últimos dias. Escreve isso e mais aquilo, aos poucos tudo vai entrando num certo eixo, e o que, ontem, parecia tão difícil, hoje já não assusta tanto. Sabidas essas bonecas, não?

15 de jan. de 2012

Leila

-- Você quer ajuda pra tentar fazer o seu poema?
-- Quero!
-- Como é a frase que você sorteou?
-- "Amizade é um assunto sério"...
-- E o que você quer escrever?
-- Que a Julia é minha melhor amiga!
-- Então vamos lá: que palavra combina com "sério"?
-- Hmm... Cemitério?
-- É. Combinar, combina. Será que não tem outra?
-- ... Mistério?
-- Boa!
...
Ontem, na oficina da Biblioteca São Paulo, a Leila escreveu:
Amizade é um assunto sério
Julia, você é a minha melhor amiga
E isso não é nenhum mistério!


Em tempo: a foto é do Genésio Manoel e Silva, da equipe da Biblioteca.

13 de jan. de 2012

Convite

O ventilador acorda o vento
O relógio inventa o tempo
A palavra veste o pensamento

O invisível faz poesia
A todo momento
...
E amanhã tem oficina de poesia para crianças na Biblioteca São Paulo, a partir das 15h. Apareçam!

11 de jan. de 2012

Concha

Olho pela lente de um daqueles antigos monóculos e me vejo num dia de sol, num verão de outro tempo, em uma das únicas fotos coloridas da minha infância: estou dentro de um grande buraco, com uma pá em cada mão, cavocando o lago inventado entre dois grandes castelos decorados com palitos de picolé. Lembro da época em que as férias e as histórias de areia pareciam não ter fim e, por um instante, quase escuto o barulho do mar ecoando dessa pequena concha de plástico.

9 de jan. de 2012

Verão

O sol não vai embora
E a noite perde a hora

Quase esquece de escurecer
E o dia custa a adormecer

5 de jan. de 2012

Caminhos

A frase começa animada e dispara em linha reta com um fôlego que promete sustentar a tensão e o ritmo por muitos quilômetros. Mas logo esbarra em uma vírgula, fica confusa, decide pensar duas vezes antes de escolher a direção: então dobra a esquina errada e acaba num beco de onde não consegue sair, cercada de pontos de interrogação.

3 de jan. de 2012

Lagartixa

Ela entra pela janela e vai deslizando, desnorteada (curiosa?), pela superfície branca e lisa. Contorna os quadros até encontrar caminho livre rumo ao ponto mais alto da parede. Experimenta o teto, desce de novo e finalmente se fixa lá em cima, descansando por um momento da sua vida nômade de lagartixa. Antes que ela vá embora, atraída por um mosquito qualquer, lembro de outra sala, há muito tempo, e quase escuto a voz da minha mãe falando de uma lagartixa que nos traria tanta sorte. Nem percebo quando estou sorrindo para a parede, grata pela visita inesperada dessa outra lagartixa, que trouxe um flash do passado como um bom presságio do futuro.