29 de jul. de 2016

nanda

Uma, duas, mil montanhas recortando o céu. Nenhum sol sorridente pairando sobre uma casinha. Nada que se pareça com uma criança de mãos dadas aos garranchos de uma mãe e um pai. Meus primeiros desenhos. É incrível... Já estava tudo ali. Já era eu, uma sementinha de Nanda, as mesmas imagens na cabeça. Por que minha mãe guardou esses desenhos e não outros, eu não sei. Talvez não tivesse outros. Será? Eu não me lembro. Nem disso nem de nada dos meus primeiros anos. Só não é escuridão total por causa das fotografias. Estou lá: um bebê no colo da minha mãe, com 1 ano, 2, depois 3, eu, cercada de brinquedos, pendurada no cangote do meu pai, com todos os avós, uma menininha simpática, cachinhos castanhos, boca, nariz, dois olhos azuis. Tudo no lugar. Pena não lembrar de nada dessa época, aparentemente estava dando tudo certo. As coisas entortaram um pouco antes do meu quarto aniversário (…).

início da história de Nanda, uma das personagens de "E no Fim... Tudo Recomeça de Outro Jeito", livro novo chegando logo, logo, com ilustrações lindas de Nobru, com o selo Moderna.

19 de jul. de 2016

sofia


(…) Não acontece mais. Antigamente, eu olhava pro céu e via a Lu brincando no meio das nuvens, fugindo de um grande dinossauro que se aproximava, descansando em cima de uma nuvem-rede, às vezes até fazendo careta pra mim. Era lindo, chegava a doer de tão lindo e de tanta saudade. Agora é diferente. É só um vazio. Uma saudade triste, como uma nuvem cinza com vontade de chorar. Descobri que o tempo tem esse poder meio mágico de decantar as coisas; é como se aquela dor tão pesada tivesse descido devagarinho até se acomodar e adormecer no fundo do coração. De vez em quando, a dor acorda. Nesses dias, olho pro céu, procuro por ela, mas não acontece mais. Mesmo assim, eu sei que a Lu tá lá, escondida atrás de uma nuvem gigantesca, desmanchando aos poucos, disfarçada entre uma, duas, mil montanhas recortando o céu.

trecho da história de Sofia, uma das personagens de "E no Fim... Tudo Recomeça de Outro Jeito", livro novo chegando logo, logo, com ilustrações lindas de Nobru, com o selo Moderna.

15 de jul. de 2016

simulacro

rosa de pano, maçã de cera, joia de vidro
-- e certos sorrisos:
tantas coisas iludem
o olhar distraído

4 de jul. de 2016

martin

(...) "Às vezes penso que, um dia desses, saindo do mar, eu encontro a Maira na praia, sentadinha, me esperando, e tudo volta a ser como antes. A gente vai se abraçar e nada mais vai doer em mim. Ainda dói. Toda vez que piso em terra firme, ela me pega, a dor. Então vou pro mar porque o mar é meu chão, cara. De vez em quando as coisas também ficam escuras dentro do tubo, mas o céu azul tá lá, sempre tá, a gente tem que acreditar, concentrar no equilíbrio pra descer numa onda gigantesca e seguir com ela até que tudo se desmanche. É isso, cara. Em todas as coisas, tem que ir até o fim". 

trecho da história de Martin, um dos personagens de "E no Fim... Tudo Recomeça de Outro Jeito", livro novo chegando logo, logo, com ilustrações lindas de Nobru, com o selo Moderna.